quinta-feira, 27 de maio de 2010

e ele sempre vem
por mais que fujamos
embora morramos
sempre vem
não tente se esconder, ele é onipresente e onipotente
escarafunchar-lhe-á
certamente
é bem de mansinho suas malícias
e entra e sufoca
não tente fugir.
já disse!
aqueça a casa, demonstre surpresa.
o beije ardentemente e seja submissa
o amor adora essas coisas.
só não corra.
embarque.

quarta-feira, 17 de março de 2010

é como se não houvesse.

Pontos
Ponto de partida para uma nova etapa de vida. Tudo devidamente anotado. A lista era extensa e ia desde encontrar rápido um novo apartamento até o que cozinharia na inauguração. A mala na porta da antiga casa imóvel denunciava o saudosismo de quem não queria ir embora sem antes dar uma boa olhada nos restos de vida que ficaram nas paredes, nas salas e no escritório. A casa mais parecia um ponto comercial. Inevitavelmente à medida que expandia seus negócios diminuía sua vida afetiva e social. E no fim de tudo, após essa proposta irrecusável de sair da cidade, não lhe sobraram muitas pessoas para se despedir. Pensou como quem pensa os tolos que era melhor assim. Agora é só correr até o aeroporto e vida nova. As aeromoças circulavam pelo corredor do avião oferecendo a refeição. A senhora magra e grisalha acariciava uma criança, o senhor da esquerda abria uma revista sobre vinhos e a moça ao lado começava a escrever no diário. Deduziu que a moça tinha alguma paixão para contar ao seu diário e que o gordo do lado era um beberrão e que a senhora era mesmo a avó da criança. Durante bom tempo se perdeu na observação dos personagens, nos gestos dos que passavam e sentavam. Percebeu assim, que as pessoas existiam, como num passe de mágica. Tentou e não conseguiu lembrar a quanto tempo não observava as pessoas, não se dedicava a elas. O trabalho lhe tirou o prazer de abrir uma boa garrafa de vinho, de escrever um e-mail a um colega de regar seu jardim. E-mails eram apenas para saber dos resultados de suas aplicações e bobices referentes ao trabalho. Ia ao jardim com a mesma freqüência que fazia doações a igreja. Mas, naquele dia, uma espécie de insight invadiu seus poros boca adentro. Que espécie de vida estava levando até ali? Estava indo para outra cidade e o plano inicial era formar clientela, ganhar mais dinheiro, ser reconhecido em sua profissão, dar palestras e... E o vazio o aterrorizou. Queria respirar, mas o paletó lhe apertava como uma camisa de força. Por que isso? Por que pensar nisso agora? Era mais uma vez se enganar, não era de agora, não era de hoje que esse sentimento lhe atacava o juízo. A agonia ia e vinha e o esconderijo para isso era o trabalho e os lucros. E se fosse pensar onde o fio de tudo se perdeu era quase impossível. Pessoa infeliz e amarga, desde que a Luisa o deixou com dois filhos a menos e quase metade de seu salário e bens concomitantemente. Não tinha como condená-la. Em casa todos se acostumaram a não ter pai e sua figura para os meninos se resumia a alguém que transitava entre o escritório e a garagem. Ninguém conseguiria viver assim por muito tempo, a Luisa até suportou demais. Era esse insustentável medo de perder as pessoas que o fazia não tê-las. E essa vida miserável o atraia como o mel atrai as abelhas. Lamentar o passado não era a solução. Ao aterrissar tentaria contatar Luisa, ela ainda o amava, todos sabiam. Além do mais, as crianças sentem minha falta, outro dia o mais velho me mandou uma mensagem via celular. Essa vida nova não teria sentido sem eles, pela primeira vez em anos parecia sóbrio e sensato. Ligaria para Luisa, ela voltaria pra ele. As crianças iriam adorar a nova cidade, os novos amigos e os novos brinquedos. Trabalharia menos, tinha bastante status pra conseguir isso. Era o melhor no que fazia. Irei tê-los de volta. Minha vida finalmente terá sentido, tenho certeza que amo a Luisa e as crianças.
-Senhores passageiros não entrem em pânico, coloquem as máscaras de oxigênio.
-Que Deus nos ajude!

sábado, 13 de março de 2010

mesmo que você fuja por labirintos e alçapões..me leve até o fim.

Becos e botecos.
O dilema entre o real e o irreal, absurdamente pulsante em todos os poros.
O amor é/ será balela? A preocupação de todos os parágrafos: amor, fonte de todas as dores do mundo. Porque não há outro sentido para a falta do nexo.
Estamos sós? Não sejamos sós!
A fresta que se abre dia a dia entre mim e eu mesmo nunca retrocederá. Morro sem saber quem sou.
Do útero para o espaço sideral com uma cápsula de molas e cicatrizes. Conectar/obter/atualizar. E o desconforto agarra as entranhas estranhamente. Vi o filho da vizinha remexer o lixo, vi a boca do meu avô aberta, vi as pequenas mãos dos Joãozinhos jogando comida fora. Vi o carro, o hipermercado. O bar, o cheiro da treva. Vi que os pássaros cantam e pessoas andam. É uma roda, um grão, um empurra que eu vou quando vê, já fomos!E estamos secos. Ocos. Vejo o magro poeta na chuva. E a rainha na casa cinco que viola as leis. A tinta da caneta pode acabar e os sons das palavras continuam, vão.
Famigerado.
As rupturas mais sacanas são saradas com mertiolate e ventilador, haja ventilador!
Têm verdinhas rolando solta na capital, tem voz morrendo dormindo.
Não vale chorar: “seu padre toca o sino que é pra todo mundo saber”.
Não fale mal das coisas simples, não fale da morte, nem de assuntos pueris.
Não fale o que não sente e nem invente, só se tem o que se dar.
E tudo sobra se apara, não para e não vale chorar.
Amo e me engano, me cobri de redondilhas. O que me redime é que não é crime.
Tenha alguém, deixe de ser incoerente e cuidemos de nossas vidas, hospícios e cavaquinhos.
O amanhã diz.

terça-feira, 23 de fevereiro de 2010

apanhador

Estou agora muito doente e debilitado.
Meu amor se foi e me Partiu em dois.
Levou a metade que já era eu.
Os retratos na parede,
recheio de vida.
Futuramente terei forças de voltar.
Penso em nadar num lago de sorte,
com poucas nuvens no céu.
Nem exijo flores.
Deixei de pensar no que era irreal.
Meu amor se foi.
O fato e que me sobraram alguns palitos de fóforos
com os quais me aqueço.
As pequenas luzes me proporcionam alvos.
Esse amor serviu para q eu me transformasse num ser especial.
Experimentei algo secreto...
Entendi.
Minhas mãos estão em forma de concha,
uma hora cai outra estrela.
E eu estarei bem debaixo do céu.

terça-feira, 15 de dezembro de 2009

Ismo.


É
apenas
um instante
de perfeição, é
apenas um sopro.É
uma lógica caótica e
doce.Pausado no teu ego.
Curvado como quem reza diante
do que interessa, sem vento, sem talento.
Intuitivamente. Sem fórmula. Salta-se e é infinito

sexta-feira, 20 de novembro de 2009

meu vinho, meu vício.

Acontece que o meu coração ficou frio
E o nosso ninho de amor está vazio.
Se eu ainda pudesse fingir que te amo,
Ah, se eu pudesse
Mas não quero, não devo fazê-lo,
Isso não acontece.

Vendo a vida passar, e sem muitos contentamentos,
vontade de parafrasear porque parece que nada vem de mim mesmo.
arrebatados pelos versos: “se desmorono ou se edifico se permaneço ou me desfaço, não sei, não sei, não sei se fico ou se passo.”
A vida tem corrido muito quieta e tranqüila, tudo no seu devido lugar?!. E isso tem incomodado como beijo gelado em meus tornozelos.
Não posso fingir, não mais.
Desejo vento e soluços, não quero que a vida passe por mim.
Não depressa como tem feito.
E eu, nesse sentimento de utopia casta e resignada.
Favelas e analfabetos correm pelo asfalto e bocas não tem o que comer, vejo tiros, AIDS e sexo pela TV,
todos estão em janelas com cara de fome. Carecas de saber que a morte está chegando
e meu amor definha.
Ele corre para algum lugar entre a madrugada e a erva fresca.
Distante de segurança e leite.
A noite é fria sem teu abraço
mas ele me sufoca e eu nem mesmo posso gritar, minhas cordas vocais
só sabem teu nome e me impedem de te dizer adeus.
Quero solidão e letras. O som da velha máquina de escrever.
Ali, do teu andar, era sossegada a noite e o mallboro era doce além de forte.
Queria voltar a ser ateu, a pichar os muros de bronze a revelar que abortei filhos e que já tive sífilis.
Sou tão mortal quanto qualquer um de vocês e tenho medo de não produzir bons poemas. Tenho
medo da chuva rala sobre meus pápeis e tenho medo de que minha única mulher tão amada descubra que me faz mal e bem.

sexta-feira, 16 de outubro de 2009

Onde estão as flores?

Quando olhou para o quadro em branco sentiu um calafrio que lhe subiu pela espinha e terminou provocando um renitente tinnnnnnnn no seu cérebro.
– Que ano! - Que ano meu Deus!
Aquele quadro em branco representava bem o que ela queria sentir... Nada!
- Era isso que deveríamos sentir quando assim quiséssemos. Porque não existia um botão escrito on embutido em nosso corpo e ao tocá-lo pudéssemos esquecer tudo? O inferno é mesmo nossa consciência.
Sentada ali, naquele chão da sala, na qual tinha acabado de dar sua última aula do semestre .
Seus alunos foram embora para as férias. E ela ficou de pé, ao menos por alguns minutos. Mas, ao apagar o quadro... Ah, maldito quadro!
Foi ele quem fez todo o estrago.
– Como alguém resume sua vida a dar aulas? Sou uma boa professora, aliás, a melhor professora de Literatura Clássica do Estado, sou independente, dona do meu nariz. Sou muito bem sucedida.
Parecia uma solilóquia empunhando essas palavras como a uma espada afiada. Se levantando do chão, limpando a saia bege. Falando e falando, tentando se convencer de que tudo estava bem. Começou a recolher seus papéis e canetas, enxugando uma lágrima que teimava em cair. Organizou um pouco a sala, as cadeiras estavam todas fora do lugar devido à euforia dos alunos com o término das aulas. Estavam com pressa, pressa em ver o sol, de começar a tão esperada folga e liberdade.
Saindo da sala ela cruza com alguns colegas professores, um deles o Cícero que trazia pela mão uma criança sorridente cuja semelhança não negava ser sua filha. Não se atreveu a perguntar. Não queria puxar assunto. Tudo que desejava era resolver a burocracia de um fim de ano letivo e ir correndo para o estacionamento da faculdade. De preferência com um saco de papel na cabeça para que ninguém a reconhecesse e viesse chateá-la com sorrisos e despedidas.
– Meu Deus! Estou fugindo de sorrisos, no que eu me tornei? Tudo ajudado por essa TPM, só pode ser, ou então é esse clima nostálgico de fim de ano. Preciso anotar esses pensamentos para contar ao Heitor, ele sim vai me entender.
Heitor era seu psicólogo e amigo, também depois de todos esses anos de convivência quem não se tornaria amigo dela?
Heitor a achava engraçada, volta e meia ele tentava lhe dar alta, mas passada duas semanas, lá estava ela de volta com dois parafusos a menos, daí o que ele podia fazer? Era tentar consertar. Sabendo que tudo aquilo não tinha precedentes na psicologia, teria certamente que inventar uma nova terminologia médica para ela. Talvez algo como: fobia de se envolver. Estava quase deixando de ser ateu e entregando a cura dela para Deus, no mais era ouvi-la, lhe dar generosas doses de doces, aconselhá-la e esperar a próxima crise.
- Aí que droga! E essa caneta que não funciona? Nem anotar meus pensamentos eu posso! Como vou dizer ao Heitor? Preciso escrever para lembrar. Droga, droga!
Ela batia a caneta com força na mesa. Tão entretida com sua fúria, não percebeu a chegada do professor Nunes na secretaria. Ele estendia uma caneta vermelha há alguns minutos em sua direção e sorria vendo seu acesso de raiva. Por fim resolveu dar uma risadinha para que ela o notasse.
– Oi Nunes, brigada. Nem te vi entrar.
– Percebi isso, bom fique com a caneta é presente de Natal. Boas férias Doutora.
– Boas férias Nunes.
Só aceitou a caneta porque realmente precisava, há algum tempo passou a não gostar do Nunes. O seu jeito a incomodava, sempre convidando para voltar a freqüentar o Centro Espírita o qual ele fazia parte. Naquele momento ela estava avessa a qualquer tipo de espiritualização. Naquele momento. Pois suas inconstâncias a fizeram gnóstica, cética, espírita, católica, cética, ateia e cética novamente. Ela não entendia como algo Maior podia ajudá-la, nenhum santo, chá ou incenso podiam preenchê-la. Então melhor não freqüentar nenhum lugar.
-Do jeito que ando iria espalhar a incredulidade nos frequentadores do Centro. Melhor não, melhor era ficar em casa com minha novela, meus cd’s, depois um filminho de comedia pra descontrair.
Tudo anotado, notas dadas, agora é só sair à francesa. Apenas alguns metros até o estacionamento, depois casa.
– Ah, como quero minha casa e um banho! Pena que não tenho um saco de papel. Espero que a Tânia não venha me perguntar de novo se quero participar da confraternização dos professores. Todo mundo se alfineta o ano inteiro, pra depois se confraternizar. Não mesmo! Não tenho paciência. Que Deus me ajude a chegar até o carro.
Colou no rosto o melhor sorriso, do tipo: estou feliz, boas férias, mas não me parem pra bater papo. E chegou sã e salva ao estacionamento. Deixou a faculdade sem olhar para trás, sabia que teria que voltar em breve para reuniões. Então não tinha motivos para um adeus cinematográfico. Colocou um som no carro que a deixasse a vontade para chorar uma dor tão insana que não valia a pena ficar guardada. Oito quilômetros até em casa. Eram tantas as lágrimas que os lencinhos de papel que tinha no carro não deram conta. Decidiu parar na loja de conveniências para comprar mais e alguma coisa para comer. No corre-corre com o término do semestre não teve tempo de parar no supermercado esses dias. Estacionou ao lado do posto de gasolina e foi direto pegar os lencinhos, abriu o pacote, tirou alguns, secou o rosto e pôs o resto na cestinha. Pegou uns pacotes de batata fritas, uma caixinha de leite e uns chocolates. Chegou em casa com a cabeça estourando de dor, sempre que chorava ficava com dor de cabeça. Talvez por esse motivo evitasse tanto chorar.
Seu apartamento tinha uma decoração discreta e simples. Por mais que tentasse nunca conseguia deixá-lo a sua cara. Então resolveu se concentrar na decoração de seu quarto, mas mesmo tentando muito arrumá-lo ele ficou com cara de escritório bagunçado. Artélia, sua empregada, também tentou arrumar o quarto e a casa, mas depois de um tempo desistiu com o incentivo da patroa. Coitada da Artélia tinha que agüentar cada coisa. Uma hora não se podia fazer sobremesas na casa, era muito açúcar para uma quase diabética, outra hora nada de café, pois lhe tirava o sono, outra hora ela perguntava aonde estavam as sobremesas e o café. Mas Artélia já estava acostumada.
O apartamento era pouco visitado. É obvio que quando sua mãe aparecia sozinha e sem avisar, ela discretamente fazia sinais para Artélia lhe lembrar de um compromisso fictício muito antes combinado para essas emergências. Pois essa visita sempre enveredava por assuntos monótonos e invasivos. Quando não conseguia convencê-la de que realmente precisava sair, imaginava a mãe falando em slow motion para se divertir e o tempo passar sem se aborrecer. Ao final de cada conversa, a mãe sempre abria uma sessão de conselhos, o último era sempre: você precisa de um marido e filhos, por isso anda estressada e amarga.
– Certo mãe, eu vou tentar arrumar alguém, quem sabe um bem parecido com o seu pra me trair bastante até que morra em cima de mim depois de vinte nove anos juntos como aconteceu com você e isso me custe três anos de terapia caríssima.
E essa conversa terminava sempre gritada no corredor enquanto sua mãe entrava no elevador, com o aparelho auditivo previamente desligado para não ouvir mais desaforos. Depois tudo sobrava para a pobre Artélia.
– Por que você deixou a dona Margô entrar?
- Porque é sua mãe?!!
-Me faça lembrar de inventar algo e não recebê-la, por favor.
– A senhora sempre diz isso e no fim das contas sempre a recebe, eu é que não me meto mais.
– Eu e meu coração mole Artélia. Eu e meu coração mole.
Tirando de lado as visitas de Dona Margô a vida na casa era muito tranqüila. Artélia já estava lá há nove anos, conhecia todos os costumes e maus costumes da patroa. E como a conhecia bem, fingiu não ver suas lágrimas e disfarçou puxando assunto.
–Como foi hoje na faculdade?
– Normal.
– Pega esse leite e põe chocolate, vou tomar um banho e já volto.
Deixou as compras na cozinha e correu desesperadamente para o chuveiro. Embaixo dele podia chorar se contorcer que ninguém veria. O banheiro era seu refúgio. Tinha o hábito de se trancar nele antes de desabar.
E o choro de hoje era intenso e amargurado.
Choro de fim de ano, recheado com a cara da filha do Cícero, a distância que mantinha de sua mãe, o caixão do pai, o marido e os negócios bem-sucedidos da irmã que a impedia de estar mais perto dela. O amor de Heitor que ela rejeitava há anos...
E o sonoro não, dentro da frase: “não podemos mais continuar com isso” da professora de Ciências Sociais que ainda ecoavam em seus ouvidos.